Entenda o caso da possível construção de três edifícios ao lado do Parque São Francisco

Por Letícia Maria Klein •
21 agosto 2024

Com 23 hectares, o Parque Natural Municipal São Francisco de Assis está localizado no topo de um morro no centro de Blumenau, perto do primeiro shopping center da cidade. Por ficar no topo de um morro, a mata em volta acabou preservada também, o que segundo a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (9.985/2000) é conhecido como zona de amortecimento: o entorno de uma unidade de conservação, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade.

Essa situação pode mudar muito em breve, porque existe um projeto de construção de três torres no entorno do parque, sendo duas residenciais e uma comercial. As construções não só estão previstas na lei de criação do parque (nº 99/95) como condicionam a existência dele aos prédios novos que seriam erguidos! 

Desenho das torres residenciais apresentado no Relatório de Impacto Ambiental
Desenho das torres residenciais apresentado no Relatório de Impacto Ambiental

A situação surgiu a partir da doação de uma grande área de terras que a Província Franciscana da Imaculada Conceição (Colégio Bom Jesus) fez ao município em 1995. Como conta Lauro Bacca neste artigo, então presidente da antiga Fundação Municipal do Meio Ambiente (hoje Secretaria), a Província não sabia o que fazer com o terreno, localizado numa Zona de Proteção Ambiental, que apesar do nome permitia a ocupação residencial unifamiliar sob certas restrições. Para evitar isso, a solução foi destinar a área de floresta mais preservada à criação de um parque e as áreas mais degradadas à construção, ficando 223 mil m² para o parque e 70 mil m² disponíveis para ocupação humana.

Paralelamente, a Lei Complementar nº 98/95 criou a Área de Proteção Ambiental São Francisco de Assis, destinada a proteger o entorno do parque, constituída por uma Zona de Transição, "com áreas sob fortes pressões sociais e relativamente comprometidas com a urbanização, devendo harmonizar a integração urbana com o ambiente natural", diz a lei. "Passado esse tempo todo, no meio do qual aconteceu a tragédia de 2008", conta Bacca no artigo, decidiu-se trocar a quantidade de seis prédios com altura menor, conforme a lei, por três prédios com altura maior. Dessa forma, o parque ganhou outros 7 mil m², chegando ao total de 230 mil m² que tem hoje.

Segundo Bacca, o cumprimento do acordo acarretará a escrituração dos 23 hectares em nome do município, significando a posse legal e consequente efetivação do Parque São Francisco. Até hoje, o terreno continua no nome da Província, e como a construção dos prédios é uma condicionante para a doação, somente após a edificação é que a área passaria a ser pública. Essa parte da efetivação legal do parque é boa, mas a construção em si das torres e suas consequências não tem nada de positivo, por causa dos impactos ambientais e também sociais.


O Ministério Público de Santa Catarina se manifestou por meio de um laudo técnico em relação à localização, dizendo que "caso não seja identificada alternativa técnica locacional que concilie o respeito às restrições legais e ambientais incidentes sobre a área investigada e os interesses do empreendedor, sugere-se a permuta desta área por outra com aptidão para a ocupação pretendida e a anexação da primeira ao Parque Natural Municipal São Francisco de Assis". Ou seja, a prefeitura poderia trocar a área por outro terreno público, e seria melhor construir em outro lugar que não tivesse tantos poréns quanto ao impacto sobre um ecossistema preservado e sobre uma região da cidade que já recebe um fluxo alto de veículos, devido à proximidade do shopping e por estar no centro. 

Na última reunião do Conselho Municipal do Meio Ambiente (CMMA), realizada no dia 13 de agosto, foi questionada a necessidade de alteração da lei para inclusão do novo projeto, que prevê três torres ao invés de seis como estava inicialmente previsto. Afinal, como pode estar sendo discutido um projeto diferente do que está previsto na legislação? Outra questão é que o parque existe e funciona há quase 30 anos, mas os prédios nunca foram erguidos, então como fica a legalidade da situação? Se o parque é uma realidade há décadas, ele deveria seguir a lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (nº 9.985/2000) quanto ao respeito à zona de amortecimento, que deve ser de no mínimo 3 km pela Resolução Conama 428/2010 para empreendimentos que requerem licenciamento ambiental.

Esse imbróglio jurídico precisa ser resolvido para que a questão possa avançar, tanto para o sim quanto para o não à construção das torres. Quanto à isso, existe a possibilidade de a Procuradoria-Geral do Município ser acionada (e na última reunião do Conselho a maioria dos presentes entendeu pela necessidade de questionamento à PGM, conforme ata), mas há forças contrárias a isso dentro da própria Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas), que buscam a aprovação do projeto sem ainda terem consultado diretamente o departamento jurídico sobre a aplicação das resoluções legais, enquanto há também forças que requerem a solicitação, segundo fontes ligadas ao caso.

A comissão da Semmas designada para o processo, composta por seis membros de diferentes áreas e nomeada pela portaria 29.695/2024, está atualmente avaliando o Estudo de Impacto Ambiental (EIA). O coordenador, que é quem relata o processo na câmara técnica do CMMA constituída para tratar do Parque São Francisco, tem o voto de Minerva em caso de empate, e ele é a favor da construção pelo que se sabe. Essa comissão é a mesma que já analisa todos os projetos de loteamentos que passam pela Semmas, tendo recebido mais essa tarefa depois que uma primeira comissão, formada por 11 servidores, não conseguia avançar com os pareceres devido ao volume de discussões.

A análise do EIA não tem prazo para acabar e pode ser afetada a partir da audiência pública marcada para o dia 27 de agosto, no Clube 25 de Julho, das 19h às 22h, onde pessoas da comunidade podem comparecer para ouvir e fornecer informações novas. Para participar, basta se inscrever por meio do link ou código QR disponíveis no edital de convocação no site da prefeitura. Caso haja informações que possam interferir na análise, elas serão consideradas no parecer técnico final do processo, que definirá ou não a emissão da licença ambiental prévia.

A condução meio torta do processo piora quando se chega na questão dos documentos apresentados pelos proponentes nessa fase de Licenciamento Ambiental Prévio. O EIA, depois de aprovado pela comissão, gera o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), uma versão resumida e aberta ao público.  Acontece que este documento, o RIMA, já está feito e disponível publicamente, antes de o estudo ter sido avaliado. Além disso, o EIA e o RIMA apresentam alternativas locacionais de construção diferentes na APA São Francisco, segundo fontes. O EIA apresenta a alternativa da lei (com seis prédios) e a alternativa que os proponentes querem que passe, que ficaria mais perto do parque. O RIMA mostra uma segunda alternativa, que não tem sido considerada nas discussões porque não foi apresentada no estudo, mas que parece a menos pior de todas: a construção mais abaixo no morro, um pouco mais distante do parque e mais perto da área urbana já construída. Existe um outro ponto ainda: a alternativa da não construção também precisa ser levada em conta, tanto no EIA quanto nas discussões da comissão e do CMMA, e pelo que se sabe isso não tem acontecido


Imagem com as duas alternativas locacionais propostas no RIMA
Imagem com as duas alternativas locacionais propostas no RIMA, sendo a alternativa 1 a mais distante do parque

Outro problema é que o RIMA só compara questões de terraplanagem e supressão, sem apresentar uma análise profunda dos impactos ambientais de cada alternativa. O Conselho já tinha dado o aval para a construção dos edifícios, visto que existe a previsão legal para isso. Uma outra comissão, da Secretaria de Planejamento Urbano, também já tinha aprovado o projeto urbanístico no ano passado. Teria também a alternativa de construção prevista na lei, que prevê a edificação de seis prédios com altura menor, mas na última reunião do conselho, Lauro Bacca e a câmara técnica argumentaram que ela causaria mais impacto do que as duas alternativas propostas no EIA/RIMA. Por fim, restam estas perguntas: por que o Conselho não discute a permuta do terreno, a não construção ou uma indenização da prefeitura à Província, comprando esse terreno?


Os impactos


Em seu artigo sobre o assunto, Bacca espera "que essas edificações, com seus futuros moradores, sejamboas vizinhas e agridam o mínimo possível o parque, com vidros antichoques de aves, paredes forradas de jardins verticais, total isolamento de ruídos de tráfego e do próprio prédio, entre outras providências." As duas torres residenciais teriam 20 andares cada, com 66 metros de altura, numa área total de condomínio com 32 mil m², e o prédio comercial teria 8 andares numa área de 5 mil m². Por mais que se obedeçam às mais rígidas formas de construção para minimizar os impactos, ainda haverá impactos, e não são poucos. 

O Parque São Francisco, aberto à visitação de terça a domingo, é lar de centenas de espécies de animais e plantas
As pesquisas científicas realizadas no parque já identificaram 394 espécies de flora (entre nativas e exóticas), 22 espécies de mamíferos, 134 espécies de aves (sendo 67 consideradas raras) e a publicação de duas novas espécies de fungos (Fomitiporia atlantica e F. subtilissima). Como ficará a visitação durante as obras? Como ficarão as pesquisas? É possível garantir que a fauna não será afetada durante e depois da obra? Perguntas que ainda precisam ser respondidas.


Parque São Francisco, no centro de Blumenau
Parque São Francisco, no centro de Blumenau

Mesmo que os edifícios apresentem os atenuantes citados por Bacca, os impactos negativos à biodiversidade de fauna e flora do parque serão inevitáveis. Segundo fontes especialistas ouvidas sobre o assunto, a intensificação do fluxo de veículos e os barulhos provenientes dos edifícios perturbariam a vida dos animais, que vivem hoje em meio ao silêncio dentro do parque (na maior parte do tempo pelo menos, quando não há visitas guiadas). O mesmo pode se dizer em relação às luzes artificiais dos prédios. Além de causar acidentes para aves migratórias, entre outros impactos, as luzes urbanas fazem as aves acordar mais cedo e, por consequência, elas se cansam ao longo do dia mais rapidamente, tornando-se presas mais fáceis. Com as luzes artificiais tão perto, uma parte do parque ficaria permanentemente iluminada, e a mudança na circulação do vento causada pela altura das torres poderia influenciar o microclima da região.

Os animais de forma geral tendem a fugir ou não residir nas bordas de uma floresta, por causa das atividades humanas, o que faria com que os habitantes do parque que hoje moram nessa parte (cercada por vegetação) se mudassem de suas tocas e talvez não mais circulassem por ali, alterando a busca por alimento. Alguns animais silvestres, porém, como o graxaim, tendem a se aproximar de humanos em busca de alimento como uma alternativa mais fácil a que eles teriam na floresta. Isso pode levar à quase domesticação de animais silvestres, o que hoje não acontece.

Existe também um problema criado pela presença de animais domésticos, especialmente cães e gatos, que podem adentrar o parque pela cerca e caçar espécies nativas, além de potencialmente provocar contaminação por meio dos seus excrementos. Essa situação já acontece hoje devido aos animais domésticos das casas que existem próximas ao parque, pelo outro lado do morro. Outra questão importante é o tratamento de esgoto, que precisa levar os efluentes tratados para longe do parque. O impacto também é social, visto que a presença de duas torres residenciais coladas no parque interferiria no fluxo de luz e vento e atrapalharia a experiência dos visitantes, que costumam buscar a Unidade de Conservação como um refúgio dos barulhos da vida urbana e uma forma de conexão consigo mesmos. 

A conservação das espécies, e do maior número possível delas, é fundamental para a continuidade das interações necessárias à vida na Terra, que depende da existência de múltiplos organismos e seus serviços ecossistêmicos. Segundo Mathias Pires, professor do Instituto de Biologia da Unicamp, "a perda de espécies leva à perda de complexidade dos sistemas ecológicos, que é o que mantém esses sistemas funcionando”, explica.  


Da perspectiva humana, o que a humanidade perde com a falta de biodiversidade são os serviços ecossistêmicos realizados pelos mais diversos organismos, como polinização, decomposição, dispersão de sementes e redistribuição da água no planeta, como o fazem as árvores. Sem as plantas, por exemplo, o ciclo hídrico desacelera, o que significa menos acesso à água. “A perda dos serviços ecossistêmicos impacta diretamente nossa saúde, nossa economia, nosso bem-estar, nosso psicológico. Ela implica perda de produtividade de vários produtos do qual nossa economia depende, implica aumento de preço, o que por sua vez causa problemas sociais e de distribuição de alimento, entre outros. Perder biodiversidade é um péssimo negócio. Não só para a biodiversidade, mas para a humanidade”, sentencia Pires.

Os pilares da solução passam por uma mudança essencial de paradigma. “Se existe uma crise da biodiversidade, a gente está no meio dela. A visão de que os organismos e os seres humanos são entidades separadas é parte do problema. Precisamos de uma mudança mais profunda na sociedade na forma como encaramos o consumo e o uso de recursos naturais. A economia é planejada com base em uma premissa de crescimento infinito, mas a Terra tem uma área limitada e recursos limitados”, avalia. "Para uma sustentabilidade a longo prazo, de milhares de anos, a gente precisa de uma mudança radical no modelo socioeconômico. Não dá para se basear na ideia de que a gente vai continuar produzindo cada vez mais e a Terra vai aguentar.” 


Por isso que é preciso conservar áreas naturais cada vez mais, e não menos. Cada oportunidade de conservar o que já existe e ainda expandir, por meio de técnicas de regeneração e reflorestamento, deve ser abraçada e colocada em prática. Mesmo que o projeto esteja previsto em lei, as leis humanas podem ser falhas, assim como ainda é a humanidade, e nesses casos o que deveria prevalecer é o bem comum de todas as espécies que seriam afetadas por determinado empreendimento, não somente a humana. Como registrou o psicanalista Carl Jung, "onde o desejo de poder é primordial, o amor estará ausente". Amor é base para a sustentabilidade, como bem disse Satish Kumar no livro "Amor radical": "Amor à vida é a forma mais elevada de amor e somente uma civilização construída a partir do amor pode ser duradoura". Duradoura porque sabe respeitar o meio do qual depende e no qual compartilha a vida com outras milhares de espécies das quais também depende. Quem ama, cuida, e cuidar de si, dos outros e do meio são ações que só podem existir em conjunto. 
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Dia Mundial do Meio Ambiente: 24 dicas de como ser sustentável em 5 áreas da vida

Por Letícia Maria Klein •
05 junho 2024

Chegou mais um 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, para nos relembrar que todo dia é dia de agirmos pensando na nossa grande casa terrena. Para combinar com a data neste ano de 2024, seguem aqui 24 dicas para você cuidar melhor de si, do outro e do ambiente em cinco áreas ou aspectos da vida, do micro ao macro. 



Espelho, espelho meu

Cuidar de si (corpo, mente e espírito) é essencial se quisermos ter uma vida saudável, consciente e feliz, e fica melhor ainda quando alinhamos esse cuidado a um estilo de vida que também cuida do planeta.

- Consuma produtos orgânicos sempre que possível. Atualmente existem muitas opções no mercado, mas vale buscar por feiras livres e também associações de produtores orgânicos e agroecológicos que entregam cestas (descobri recentemente um desses grupos de compras coletivas em Blumenau, caso você more aqui e tenha interesse).

- Ao comprar produtos de beleza e higiene pessoal, priorize marcas que não fazem testes em animais, que sejam veganas, que tenham ingredientes de origem natural e orgânica e também opção de refil, assim você reduz o consumo de embalagens plásticas. 

- Quando precisar de roupas, busque antes em brechós ou troque com amigos ou familiares. Se não encontrou, procure por marcas responsáveis e slow fashion e prefira peças feitas com fibras naturais, como algodão e linho.

- Fortaleça seu corpo e mente com exercícios físicos.

- Tenha um momento no dia que seja seu, mesmo que por 15 minutos, para relaxar, desacelerar, refletir, meditar, respirar conscientemente, ler uma mensagem edificante, olhar o céu, admirar a beleza natural que te cerca. Esse tipo de ação nos acalma e nos traz para o presente, aumentando a nossa consciência e percepção sobre nós mesmos e nosso agir no mundo.

Casa

- Monte uma horta em casa ou apartamento (neste caso, as verticais na sacada ou numa parede que pega sol são ótimas) com os temperos e hortaliças que mais consome. Além de garantir uma alimentação orgânica, você economiza dinheiro. 

- Quer diminuir pela metade a quantidade de resíduos que produz? Faça compostagem! Pode ser com composteira seca, minhocário ou direto na terra se você mora em casa. Você também pode buscar por programas de compostagem na sua cidade e se inscrever para ter seus resíduos orgânicos recolhidos. 

- Substitua as sacolas plásticas nas lixeiras por sacos ou sacolas de papel. Para guardar os resíduos recicláveis, use as embalagens dos produtos que compra e também caixa de papelão que você pode pegar em mercados.

-  Aproveite as cascas e sementes de alguns alimentos para fazer aperitivos, sopas, cremes, bolos, tortas etc. Cascas e sementes de abóbora no forno, com sal e azeite de oliva, ficam uma delícia!

Lazer

- Quando viajar, compense sua pegada de carbono comprando créditos de carbono de projetos de reflorestamento. Algumas companhias aéreas fornecem essa opção durante a compra da passagem.

- Se você gosta de trazer souvenirs de volta da viagem, compre de produtores locais e artesãos.

- Leia livros, assista filmes e documentários e acompanhe perfis que falam sobre a temática socioambiental, para conhecer sobre diversos aspectos e aprender cada vez mais formas de viver de maneira sustentável. 

- Experimente atividades de lazer de baixo custo e baixo carbono, como fazer um piquenique no parque, jogar com os amigos em casa, nadar no rio, fazer doces com as crianças, montar um quebra-cabeça...

- Se for passear numa feira ao ar livre ou num festival, por exemplo, tenha sempre um copo retrátil à mão ou à tiracolo para beber ou comer sem usar copos descartáveis. 

Trabalho fora

- Tenha uma caneca e uma garrafa de água para evitar os descartáveis na empresa.

- Se você almoça na rua, prefira almoçar no restaurante em vez de pegar marmita ou leve seu próprio pote para isso.

- Converse com seus colegas sobre terem uma composteira na cozinha. 

- Desligue o computador na hora do almoço, para economizar energia.

- Dê carona ou vá de carona com colegas, se você costuma usar carro.

Sociedade

- Quando sair, leve um kit sustentável consigo, contendo: talheres, guardanapo de pano e canudo não descartável. 

- Vote em candidatos com propostas que contemplem adaptação climática e medidas ambientais protetivas e acompanhe as consultas públicas no site do Senado, votando contra propostas que prejudicam o meio ambiente e consequentemente a nós mesmos e outros seres. 

- Se você frequenta restaurantes onde os talheres são embalados em plástico, sugira ao proprietário ou gerente trocar o saquinho por papel ou por uma caixa para os talheres. Já fiz e funciona!

- Infelizmente ainda vivemos em sociedades de consumo, então precisamos ter cuidado para não cairmos nas armadilhas de consumismo. Quando precisar de algo (atenção, precisar, não somente querer!), pergunte-se: por que comprar? O que comprar? Como comprar? De quem comprar? Como usar? Como descartar? E experimente esperar um mês ou mais antes de comprar pra ter certeza de que aquilo é de fato necessário. E se conseguir comprar usado, todos saem ganhando!

- Leve determinados resíduos a pontos de coleta específicos, como lâmpadas, pilhas e baterias, óleo de cozinha usado (esses três costumam ser aceitos em grandes redes de mercado), roupas para doação e reciclagem (como o programa Caixa Solidária) e embalagens plásticas (como o programa Boti Recicla, nas lojas do Boticário, que aceita produtos de todas as marcas). 


Já faz alguns desses? Me conte aqui embaixo, e obrigada por vir!

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Tragédia climática no RS escancara necessidade de mudanças de pensamento e comportamento

Por Letícia Maria Klein •
07 maio 2024



Ilustração de Alberto Benett na Folha de S. Paulo 


"Somos feitos uns dos outros", diz Satish Kumar no livro "Amor radical", lançado em português em 2024 pela editora Bambual. 


Somos feitos das nossas experiências, das nossas interações com os outros seres, das emoções e sentimentos que vivenciamos desde o nascimento, de tudo o que lemos, vemos e ouvimos, do que damos e recebemos, de tudo que pensamos e fazemos, do que é feito conosco, de tudo o que nos alimenta, física e espiritualmente. Somos feitos dos nossos pais, amigos, conhecidos e até dos "estranhamentos". 


Somos feitos de carne, osso, sangue, alma, carbono, água, de minerais e vitaminas que adquirimos dos alimentos que vêm do solo e que passaram por diferentes mãos para chegar até nós. Somos feitos do ar que é gerado por algas marinhas e plantas terrestres, ar que é poluído pelo excesso de gases dos veículos e fábricas e por microplásticos que invadem nossos corpos e os dos animais sem pedir licença. 


Somos feitos da mesma água que abastece rios, lagos, mares e tantos outros seres vivos, todos dependentes do líquido que dá vida. Somos feitos do solo que nos sustenta e gera vida, que por sua vez nos alimenta com seus frutos e nos abriga com sua madeira, entre tantos outros presentes que não comumente reconhecemos nem valorizamos.  


Somos feitos das consequências de tudo que causamos - e tudo que causamos têm consequências, sejam pequenas ou grandes, boas ou más, individuais ou coletivas. Nós somos enquanto estamos em constante troca com o meio que nos cerca. 


Envenenar o solo com agrotóxicos, poluir o ar com gases nocivos, sujar a água com produtos químicos e plásticos, consumir sem critérios - sem pensar na necessidade da compra, na cadeia produtiva, na vida útil e no futuro descarte do produto, na responsabilidade social e ambiental das empresas - e votar em políticos que não pensam holisticamente e em longo prazo significa prejudicar a nós mesmos, agora e depois. 


As mudanças climáticas, que têm se manifestado na forma de eventos intensos e cada vez mais frequentes em todo o planeta - incluindo as enchentes no Rio Grande do Sul - são consequências dos comportamentos egoístas, individualistas, imediatistas e desconectados do meio e dos outros seres vivos que a humanidade tem tido nos últimos 400 anos principalmente (partindo da expansão do pensamento cartesiano e da Revolução Industrial). 


Agimos como se nossas ações não tivessem repercussão ou impacto sobre tudo o que nos cerca, como se fôssemos totalmente independentes e separados do solo, da atmosfera, da água e dos outros seres vivos que abrigam este mesmo planeta Terra onde vivemos. É um absurdo pensar que podemos ter um modelo econômico de crescimento infinito num mundo com bens naturais limitados, e ainda assim é dessa forma que a maioria absoluta das sociedades está estruturada. As consequências disso são inevitáveis e já chegaram, trazendo o aviso de que a situação vai piorar se nós não modificarmos nossas linhas de pensamento e ação. 


Precisamos mudar nossos comportamentos enquanto indivíduos, coletivos, instituições e estruturas sociais. O que fazemos reverbera no todo, que depois retorna a nós mesmos. Mudanças climáticas não são somente um assunto ou um problema ambiental, assim como nenhum outro é, porque tudo o que afeta o ambiente afeta diretamente a sua biodiversidade, à qual pertence a espécie humana. Segundo informações do Observatório do Clima nesta semana, vinte e cinco projetos de lei e três emendas à Constituição estão tramitando no Congresso brasileiro, com alta probabilidade de avanço imediato e que, se aprovados, "causarão dano irreversível aos ecossistemas brasileiros, aos povos tradicionais, ao clima global e à segurança de cada cidadão". Causarão danos a cada um de nós. 


Falar de mudanças climáticas é falar de produção de alimentos, de infraestrutura urbana, de saúde, de desigualdade social (visto que a maioria dos atingidos são as populações mais pobres e marginalizadas), entre outros temas que dizem respeito à vida humana em sociedade. É primordial voltarmos a viver e a ver a vida de maneira holística e sistêmica, compreendendo que estamos todos interligados numa teia existencial complexa e delicada, da qual não é possível sair e da qual dependemos integralmente. 


Somos feitos uns dos outros, então tudo que fazemos aos outros - sejam eles quem ou o que forem - fazemos a nós mesmos. Viver de maneira sustentável é, antes e acima de tudo, valorizar a vida. Não é um tripé com base financeira, é um tripé baseado no amor: a preservação da vida no planeta depende de cuidarmos de nós mesmos, do outro e do meio que nos sustenta, em relações de afeto, respeito e solidariedade. 

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