Mundo Sustentável, de André Trigueiro [Resenha]

Por Letícia Maria Klein •
29 agosto 2013

Se você quer começar a ler livros sobre sustentabilidade, Mundo Sustentável – abrindo espaço na mídia para um mundo em transformação é uma ótima opção. Escrito pelo jornalista ambiental André Trigueiro, o livro aborda diversos assuntos relacionados ao meio ambiente e à sociedade, como lixo, energia, aquecimento global, água e padrões de produção e consumo, e aponta soluções para vivermos de forma sustentável. O livro é, na verdade, uma reunião de entrevistas, artigos e comentários de André que foram transmitidos na Rádio CBN, no canal de TV a cabo Globo News, no jornal O Globo e no site Ecopop. O livro foi muito importante para o meu trabalho de conclusão de curso, que abordou o jornalismo ambiental, até porque tem uma seção dedicada a mostrar o trabalho dos jornalistas que atuam no segmento de jornalismo ambiental e como os profissionais de imprensa devem se colocar frente às questões que constituem a crise ambiental vivenciada hoje por todos os povos e países. 



Uma das partes que eu mais gosto no livro é quando André fala sobre a visão sistêmica de meio ambiente, uma ferramenta importante para compreender a realidade, pois revela o quanto seres humanos e natureza estão interligados e afetam-se mutuamente. Entender esse conceito, e aplicá-lo, é fundamental para viver sustentavelmente. Ele diz que a visão sistêmica deve começar a ser ensinada nas escolas de ensino fundamental e médio, para que as crianças cresçam sabendo a importância de preservar a natureza e zelar por ela. Numa das passagens, ele conta uma maneira de exercitar essa visão. A atividade foi realizada com estudantes de jornalismo da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, onde é professor do curso de Jornalismo Ambiental.
Mais do que a terra batida que havia antes, o asfalto acumula calor e esse calor aumenta a temperatura média do campus. A construção do estacionamento implicou também a retirada de algumas árvores, o que faz aumentar ainda mais a sensação térmica de calor. A elevação da temperatura média do campus poderá implicar o maior gasto de energia com aparelhos de ar-condicionado e ventiladores. Aumenta-se o custo operacional, eleva-se a mensalidade dos alunos. Nas áreas sem refrigeração, é possível que essa dose extra de calor gere mais desconforto e, eventualmente, perda de produtividade. 
[...] A absorção de água de chuva do asfalto é muito menor do que a da terra batida que havia antes da construção do estacionamento. Há, ainda, o complicador de não haver ralos ou galerias de água pluvial. 

[...] A maior oferta de vagas no campus facilita a vida de professores, alunos e funcionários que têm carro. [...] Aumenta-se, por outro lado, a carga de veículos nas ruas da cidade, na escala do milhar. Mais engarrafamento, mais poluição, mais emissões de gases-estufa.
Adoro esse exemplo, pois fica bem claro como tudo é interdependente. Durante a produção do meu TCC, eu aprendi que não existe dualidade entre humanidade e natureza. O homem da natureza faz parte e dela depende, como todas as outras espécies. Isso fica bem claro durante o livro, que traz um panorama dos problemas que afetam o meio ambiente e, por consequência, as pessoas, propondo maneiras de minimizá-los.

É uma leitura fácil e muito interessante. O livro foi lançado em 2005 e até hoje era muito procurado, o que levou o jornalista a lançar este ano Mundo Sustentável 2 – novos rumos para um planeta em crise, que foi além da ideia de rever o primeiro e virou um projeto novo. Afinal, como ele diz, o mundo mudou muito nesse período. Já está na minha lista de leitura! Assim que ler, faço uma resenha para o blog. Ah, os dois volumes são impressos em papel reciclado e certificado. No vídeo abaixo, André Trigueiro participa de uma conversa sobre os livros (e muito mais) no programa Sempre Um Papo. É muito interessante, recomendo!


Se você já leu o livro, o que achou? Fique à vontade para comentar!
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Bromélias, mais bromélias e uma placa para os peixes

Por Letícia Maria Klein •
22 agosto 2013
Eu sempre quis uma fonte de água em casa, daquelas decorativas com bambu e que oferecem aquele barulhinho tão relaxante da água rolando. Qual não foi a minha surpresa ao me deparar com uma dessas na escola Conselheiro Mafra, onde aconteceu no último sábado, 17 de agosto, a primeira ação do Nós Podemos Blumenau, movimento em prol dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio que foram criados pela ONU em 2000. Só que a fonte não daria pra levar pra casa: era bem maior, com bromélias em volta, um só bambu e, apesar de não parecer à primeira vista, abrigava alguns peixes. Cascudos, precisamente. Depois de umas três horas, bromélia pra cá, bromélia pra lá, pedras aqui, pedras ali, mais alguns bambus e uma tábua, ficou uma graça! E agora todo mundo que passa sabe que lá tem peixe. 

Momento do antes: a fonte como era

Porque né, tem gente que passa, acha que é pia e para pra lavar a mão. Eu vi. Agora com a placa, espero que não mais. A nova fonte ficou até mais segura para as crianças, que podiam escorregar na terra e não tinham onde se segurar para tentar achar os cascudos (eles se colam nas pedras do fundo de um jeito que é bem difícil ver mesmo). Graças aos dotes de design de interiores de Tatiana Dallacorte, agora tem uma barreira de bambus onde se segurar e uma tábua de madeira onde pisar. Cuidar da fonte foi a tarefa que ela e eu tivemos como voluntárias do grupo responsável pelo objetivo do milênio número 7 – Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente durante a tarde no Centro de Atenção Integral a Criança e ao Adolescente e Escola Básica Municipal Conselheiro Mafra, mais conhecido como CAIC da Velha (o nome do bairro). O grupo do ODM 7 foi coordenado pela bióloga Fabiana Dallacorte, irmã de Tatiana.

Como ela ficou depois de reformulada

O grupo todo devia ter umas 30 pessoas e foi dividido em três equipes: uma para cuidar do jardim externo, outra para o jardim interno e outra para reparar a fonte. A maior parte da turma ficou no jardim externo, ajudando a plantar mudas e arrumar o terreno. No jardim interno, que fica em frente à fonte, ficaram umas cinco ou seis pessoas. Encarregadas da fonte ficamos a Tati, eu e mais dois voluntários, que nos ajudaram andando de um lado para o outro procurando o que precisávamos para melhorar a casinha dos peixes. No fim, depois de poucas horas, estava tudo renovado! Jardins com plantas e flores (redundância necessária porque antes quase só se via a terra) e um aquário/fonte, o xodó do zelador da escola que nos ajudou muito, mais bonito e seguro. E com mais bromélias, que nós levamos para a escola.

Jardim externo replantado, só tem que 
esperar um pouco até crescer e florescer

A ação teve grupos de todos os oito ODM, ou os 8 Jeitos de Mudar o Mundo, como são conhecidos no Brasil. Além do ajardinamento, teve atividade de pintura do refeitório e da sala multimídia da escola, oficina de Ikebana para mulheres (para aprender a montar arranjos de flores), palestra para adolescentes, palestra sobre violência doméstica, orientações sobre saúde infantil e de gestantes, inauguração da sala de jogos, entre outras. O dia foi movimentado! Pena que o número de voluntários e participantes nunca é o que se espera. Pra falar a verdade, eu achei que mais pessoas estariam presentes, fosse ajudando como voluntárias ou participando das atividades. O envolvimento de forma geral foi pequeno, mas o bom é que todos que estiveram presentes cumpriram o que o movimento tinha se proposto a fazer nesta ação. 

Com a mão na terra

Eu adorei ter feito parte do grupo que ajudou a tornar o ambiente de mais de 800 alunos mais verde. É fundamental que já na infância se tenha contato com a natureza, pois se aprende na prática a importância da preservação, do equilíbrio no meio ambiente e do cuidado e respeito ao próximo. Próximo humano, animal ou vegetal, independentemente, pois todos são seres vivos e na grande teia da vida não existe hierarquia. Cada um tem a sua importância e o seu papel para que o ecossistema se sustente. Além disso, o voluntariado é uma atividade muito gratificante. E pode ser bem atlética, como bem comprovamos. Carregar vasos, revirar a terra, plantar e replantar... não é moleza, mas é tudo de bom! É uma das atividades em que você mais sente a conexão com a natureza. Amei! Não vejo a hora de participar de outras ações ligadas à natureza. (E não falta muito, já fiz minha inscrição no Avistar Vale Europeu, aqui na região, para observação de aves. Saiba mais sobre essa atividade neste post. Depois eu conto como foi!). 

E você, já fez alguma atividade de voluntariado? Alguma ligada ao meio ambiente? E outras atividades ligadas à natureza? Me conte nos comentários! Até logo!
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Parques, pra quê te quero?

Por Letícia Maria Klein •
08 agosto 2013
Talvez você já tenha visitado o Corcovado e o Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, ou as Cataratas do Iguaçu, no Paraná. Se não foi, com toda certeza do mundo já ouviu falar. Sabe o que eles têm em comum? Ficam dentro de parques nacionais. Então se você já tirou foto na frente do Cristo ou ficou encharcado enquanto olhava as cataratas, você esteve nos dois parques brasileiros que mais recebem turistas todo ano. Em 2012, o Parque Nacional da Tijuca, no estado fluminense, foi visitado por mais de 2,5 milhões de pessoas e o Parque Nacional do Iguaçu recebeu 1,5 milhão de turistas. No mesmo ano, cerca de 9,7 milhões de pessoas foram dar uma volta no Great Smoky Mountain, o maior parque nacional dos Estados Unidos. É mais do que o dobro da soma dos dois parques brasileiros mais visitados. O que isso nos mostra? Que o Brasil tem muito a ganhar com os seus 68 parques nacionais. Tanto em dinheiro – as contas passam de um bilhão e meio em 2016 – quanto, e principalmente, em preservação de tão rica biodiversidade e conscientização ambiental.

Os dados acima estão na reportagem de capa da revista Planeta de julho deste ano. Ela faz um apelo às autoridades para abrirem todos os parques – dos 68 apenas 26 estão abertos à visitação – e dar a devida atenção que eles merecem. O turismo sustentável também foi destaque do 3º Conatus – Congresso de Natureza, Turismo e Sustentabilidade, realizado em julho na cidade de Bonito, no Mato Grosso do Sul. O tema está à tona e vem tarde. Frente à necessidade que temos de mudar de hábitos, viver uma vida sustentável e repensar nossos padrões de produção e consumo, o Brasil, com sua mega biodiversidade e paisagens de encher os olhos, está perdendo muito ao ignorar o potencial dos parques nacionais: fonte de renda, de empregos, de pesquisas e, especialmente, de educação ambiental e preservação de espécies, os dois objetivos primários dos parques nacionais.


Parque da Tijuca, criado em 6 de julho de 1961. Foto: ICMBio

Eu já falei aqui no blog sobre um parna (abreviação de parque nacional), o da Serra do Itajaí, com seus mais de 57 mil hectares espalhados por nove cidades de Santa Catarina, inclusive Blumenau (e eu ainda não fui visitar – que vergoooonha!!). Os parques nacionais são um tipo de unidade de conservação, na verdade, a mais antiga e também mais popular. O site do ICMBio diz que, pela lei brasileira, um parque nacional serve para preservar ecossistemas de importância ecológica e lindas paisagens, além de permitir pesquisas científicas, atividades educacionais e de interpretação ambiental, recreação e turismo ecológico. O ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade é quem gerencia os parques. O instituto foi criado em 2007 e faz parte do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Ao todo no Brasil são 321 unidades de conservação, todas geridas pelo ICMBio. Elas estão divididas em dois grandes grupos, de Proteção Integral e de Uso Sustentável, somando 12 categorias. Parque Nacional é uma das categorias do grupo de Proteção Integral.

Tudo parece muito bonito, mas a realidade é bem diferente. Sabe o que o Parna da Serra do Itajaí tem em comum com a maioria absoluta dos outros parques? Aí vai a lista: falta de funcionários, falta de infraestrutura (como estradas de acesso, sinalização, segurança, banheiros), falta de investimento, falta de interesse e de comprometimento do poder público. Quando o governo federal precisa economizar, adivinha quem sofre o primeiro corte? O MMA e, por consequência, o ICMBio. A matéria da revista Planeta mostra alguns números: dos R$ 4,1 bilhões previstos para o ministério em 2012, apenas R$ 1,1 bilhão foi repassado. A parcela do orçamento da União que vai para o ministério é menos de 1%. Para ser exata, 0,15%. Em valores para o ICMBio, são R$ 503 milhões por ano. Para pagar funcionários, que são cerca de 5.600, e cumprir com as atribuições das 312 unidades de conservação. É ridículo de pouco e mostra como o meio ambiente é menosprezado pelo poder público.

Parque Nacional do Iguaçu, criado em 10 de janeiro de 1939. 
Foto: ICMBio

É claro que o dinheiro que os parques ganham com o turismo ajuda, mas nem com isso o governo colabora. A reportagem mostra que dos R$ 17 milhões que o Parque Nacional do Iguaçu arrecadou em 2012, só R$ 3 milhões ficaram no parque para pagar as despesas. O restante foi para Brasília. A falta de verba gera outros problemas. Um deles é a quantidade de funcionários. A maioria dos parques precisa se virar com menos de 10 ou 20 pessoas. O Parna da Serra do Itajaí, por exemplo, tem seis. O maior parque brasileiro, o das Montanhas do Tumucumaque, no Amapá, tem quatro. São mais de três milhões e oitocentos mil hectares sob a responsabilidade de quatro pessoas! Tem as exceções, como sempre. O Parque da Tijuca tem mais de 150 funcionários e o do Iguaçu tem 800 (oitocentos, mesmo). Olha a diferença, galera!! É o parque com maior pessoal e ainda assim o gestor da unidade reconhece que não é o suficiente.

Isto porque a falta de pessoal (ou gente suficiente) abre portas para outros problemas que afetam muitas dessas unidades de conservação: caça, pesca, construções irregulares e extração ilegal de alimentos. Os parques da Serra do Itajaí e do Iguaçu, por exemplo, sofrem com o contrabando de palmito juçara. A caça e o comércio de fauna silvestre são uma das piores ameaças, mesmo fora dos parques nacionais. Neste último domingo, um casal de ambientalistas foi agredido em sua propriedade particular por um caçador, em Atalanta, Santa Catarina. Imagina o pavor da pessoa ao sair de casa pra fotografar a paisagem e dar de cara com uma arma apontada pra ela?!

E se falta verba pra manter os parques abertos e pagar as despesas, como indenizar e desapropriar as propriedades privadas que ficam dentro dos parques? Este é outro grande impasse, que tem relação com a caça e pesca ilegais. Muitos caçadores moram dentro ou nos arredores do parque (leia mais sobre isso no post sobre o PNSI). O que leva à outra questão: educação e conscientização ambiental. A segunda prioridade dos parques nacionais, depois da preservação. Está tudo interligado, relacionado, e enquanto o governo não estabelecer o meio ambiente como uma prioridade, os problemas vão continuar. Como o dinheiro está sempre na mira dos políticos, é de estranhar que eles ainda não tenham reconhecido o valor do turismo sustentável. Como disse um professor meu certa vez: uma floresta morta dá dinheiro uma vez, uma floresta viva dá dinheiro sempre. É o que mostra a reportagem da revista Planeta: um estudo da ONU revela que o Brasil poderia gerar até R$ 1,6 bilhão em receita com os parques nacionais em 2016, quando as Olimpíadas chegam às terras tupiniquins.


Parque Nacional do Itatiaia (RJ), o mais antigo do Brasil, 
criado em 14 de junho de 1937. Foto: ICMBio

Quem disse que sustentabilidade e economia caminham em direções opostas? É claro que não dá pra sair abrindo tudo que é parque a torto e a direito. Também não é pra abrir o parque inteiro à visitação. Sempre tem uma parte onde nenhuma pessoa pode entrar, pois o objetivo é a preservação ambiental integral. No Parna da Serra do Itajaí, por exemplo, cerca 2,5% estão na Zona Intangível; a maior parte, cerca de 70%, está na Zona Primitiva, que permite atividades de pesquisa e educação ambiental restritas às caminhadas em trilhas. É importante lembrar que a função dos parques não é dar dinheiro, é preservar hábitats e espécies e educar a população para a importância da conservação. A responsabilidade de abrir um parque é muito grande e é preciso muita coisa pra abrir um e mantê-lo funcionando adequadamente (e aqui a gente volta lá para os problemas): funcionários suficientes, infraestrutura adequada e um plano de manejo da unidade (que dita as ações necessárias para uma gestão sustentável do parque).

Para cumprir sua missão de proteger a natureza, o parque precisa impor limites aos visitantes, ter uma infraestrutura que suporte a presença de milhares de turistas por ano, causando o mínimo impacto possível na natureza, e ter uma educação ambiental forte. Despertar os turistas para a necessidade da sustentabilidade e da conservação é fundamental. Alertá-los para não tirar nada do parque e não deixar nada lá, principalmente lixo. A única coisa que deve sair do parque junto com o turista é a lembrança. Por isso a conscientização ambiental é tão importante. Todos nós que visitamos parques ou vamos visitar um dia precisamos entender que estamos ali para aprender e reconhecer a grandeza da natureza, entender que o ser humano não é soberano na Terra, é apenas mais uma espécie que precisa conviver em harmonia com as outras.

Eu sou a favor da abertura dos parques, mas eles precisam de rigorosidade e excelência em infraestrutura para que não acabem causando efeitos contrários ao que pretendem. E você, concorda? Já visitou algum parque nacional? Deixe sua opinião nos comentários. Se quiser saber mais sobre os parques nacionais, confira uma matéria do programa Cidades e Soluções sobre o assunto (parte 1 e parte 2), que apresenta os dois parnas brasileiros mais visitados. Tem outros links bacanas aqui embaixo sobre turismo sustentável e unidades de conservação, se você se interessou e quer aprofundar seus conhecimentos. Obrigada pela companhia e até breve!

Parques nacionais vistos do espaço: Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sul, Sudeste.
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Por que o slow food deve estar na sua mesa

Por Letícia Maria Klein •
03 agosto 2013
Nas cidades grandes o ritmo é acelerado. O tic-tac do relógio está sempre te lembrando de alguma coisa pra fazer. Trabalho, escola, faculdade, cursinho, creche, academia, cada atividade calculada com muito carinho para caber nas 24 horas do dia. E se o dia tivesse mais horas, a gente já ia arranjar alguma outra coisa pra colocar no meio, não é mesmo? Com tanta coisa pra fazer, a gente liga o piloto automático e vai. Uma beleza, né. Ahn, só uma coisinha: como anda nossa qualidade de vida no meio disso tudo? De vez em quando ela fica de lado, fala a verdade. Com a vida a todo vapor, acabamos nos esquecendo dela vez ou outra. Mas um certo italiano não esqueceu. 

Foi pensando na qualidade de vida dos seus cidadãos que Paolo Saturnini, prefeito da pequena cidade de Greve in Chianti, na região italiana da Toscana, procurava uma solução pra uma questão presente em todas as comunidades: como uma cidade pode se desenvolver sem prejudicar a qualidade de vida de seus habitantes? Isto foi em 1999. Hoje, 176 cidades em 27 países seguem o que Paolo criou lá atrás, o Movimento Cittaslow. Misturando italiano com inglês, o termo designa cidades que não querem virar grandes centros e não colocam o crescimento a qualquer custo em primeiro lugar. Elas estão preocupadas mesmo é com a qualidade de vida de seus habitantes. E pra garantir isso, elas criam projetos que promovem e cuidam da cultura e gastronomia locais, que usam novas tecnologias, que aproveitam e otimizam o território, e, claro, que preservam o meio ambiente


Deixa eu citar alguns exemplos pra ficar mais claro como funciona uma cittaslow, em português, cidade lenta. Em entrevista ao site Envolverde, Paolo, que hoje é presidente honorário e presidente do Conselho Garantidor de Qualidade da organização, falou bastante sobre o movimento. Ele citou alguns exemplos de como Greve in Chianti mantém a qualidade de seus cidadãos. A cidade adotou um novo plano diretor que limita a construção de novos prédios. A prioridade é aproveitar áreas e construções que já existem. Até os hotéis, pois é uma cidade que recebe muitos turistas, são criados em prédios existentes. 

A agricultura local é bem forte, “associando a qualidade e a origem de alimentos produzidos localmente à educação, educação alimentar e educação ambiental, incentivando o uso de merendas ligadas ao território e à cultura”, explica Paolo. Outro exemplo são as vinícolas, onde são adotadas novas técnicas que respeitam o solo e a paisagem. Como diz Paolo, a cidade lenta combate os geradores da má qualidade de vida, que muitos de nós conhecemos bem: estresse, pressa, perda de referências e pressão que temos de valores que não são naturais. 

Ficou com vontade de conhecer uma cittaslow? Confira a lista aqui. Mas para visitar uma vai ser preciso viajar ao exterior. O Brasil ainda não tem uma. Segundo o repórter que entrevistou Paolo, a cidade de Tiradentes, em Minas Gerais, começou um processo para se associar ao movimento, mas ele foi interrompido. Paolo acha que será retomado, vamos ver. Para se associar ao Movimento Cittaslow, não basta só preencher uma fichinha de inscrição. 

A cidade paga 600 euros, é visitada por auditores e precisa fazer uma reunião com outras três cidades já associadas. Depois, o município deve aceitar os termos dos Estatutos da organização e se comprometer com políticas públicas que ajudem a desenvolver um ambiente onde os objetivos do movimento possam ser atingidos. Política de planejamento para melhorar o território, política ambiental para recuperação e reciclagem de resíduos, avanços tecnológicos para melhorar a qualidade ambiental e de áreas urbanas, produção de alimentos a partir de métodos naturais e ecológicos, preservação das tradições locais, políticas e serviços públicos de defesa de grupos excluídos, convivência harmoniosa entre habitantes e turistas e educação para os dois sobre o que significa viver em uma sociedade lenta. 

Cidade de Greve in Chianti, na região de Toscana, Itália

A lista das cidades ainda é pequena, pouco menos de 180 cidades no mundo todo. Para ser uma cittaslow, o município deve ter, no máximo, 50 mil habitantes – a cidade italiana que fundou o movimento, por exemplo, tem cerca de 15 mil. Isto porque o movimento é mais adequado a cidades pequenas, para evitar que elas cometam os mesmos erros das cidades que cresceram sem controle e sem infraestrutura necessária. Como diz Paolo, “cidades pequenas devem preservar, cidades grandes precisam revolucionar – e não sabem como”. É possível que esse limite seja revisto conforme o movimento cresça. 

O Brasil pode não ter nenhuma cittaslow, mas tem outros movimentos que são similares, como o Transition Towns e o Cidades Sustentáveis, do qual Blumenau faz parte. Inclusive já falei sobre ele aqui no blog. Outro movimento que nasceu da mesma concepção do Cittaslow, de proteger o meio ambiente e manter a qualidade dos produtos locais, é o Slow Food. Na verdade, o Slow Food serviu de inspiração para a criação do Movimento Cittaslow. 

Ele surgiu em 1989 como uma resposta à onda de fast food, ao ritmo agitado da sociedade atual, ao desaparecimento da culinária local, ao desinteresse das pessoas na própria alimentação, em saber de onde vêm os alimentos e em como as nossas escolhas alimentares podem afetar o planeta. Hoje são mais de 100 mil associados. No Brasil, o Slow Food está presente desde 2004. O site do movimento é rico em informações e mostra todas as comunidades brasileiras que têm atividades ou projetos do Slow Food, como os Convivia, as Fortalezas, a Arca e Terra Madre. Vale a leitura. Aqui em Blumenau tem uma comunidade, estou curiosa para visitar! E neste movimento, você, pessoa física, pode se associar.


Independentemente do movimento, todos têm em comum a preocupação com a sustentabilidade e a qualidade de vida. Eles querem que a gente se alimente melhor, tenha mais saúde e se preocupe com o meio ambiente e os bens naturais, pois deles dependemos totalmente. Não sei você, mas me deu uma vontade de passar uma temporada numa dessas pequenas cidades lentas e apreciar a vida que, na correria do dia a dia, muitas vezes nem vemos passar!
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