A crítica de Andy Singer

Por Letícia Maria Klein Lobe •
28 novembro 2013
Carros, aquecimento global e destruição ambiental são um dos principais alvos do cartunista estadunidense Andy Singer. O estilo de vida atual e a presença maciça de tecnologias e indústrias também. Seus cartoons, intitulados No Exit (Sem Saída), são publicados em jornais, livros e revistas nos Estados Unidos e em outros países, além de já terem sido lançados em seis livros. Em 2012, as obras do artista foram expostas pela primeira vez no Brasil, na cidade de São Paulo. Andy começou a desenhar desde cedo, com dois anos de idade, e hoje é reconhecido internacionalmente por seu olhar ambiental e visão crítica da sociedade. Eu trouxe pra cá alguns cartoons que achei bem legais. Veja abaixo e depois me diz se gostou também!

Rapidinho, antes das imagens, uma curiosidade. O site Vá de Bike contou que o cartaz da exposição apontava o transporte e alternativas para automóveis como um dos grandes interesses na vida do cartunista. “Andy Singer e sua esposa não possuem carro e tentam chegar a todos os locais com bicicletas, caminhando ou utilizando transporte público. Em seu tempo livre, Andy também é voluntário co-presidente da Saint Paul Bicycle Coalition, tentando fazer a sua cidade (Saint Paul, Minnesota) mais amigável à bicicleta”. Legal, né!


Esse cartoon desconstrói o que se tem por evolução automotiva. O carro aqui é uma forma anterior à bicicleta, que é mais evoluída porque causa muito menos impacto ambiental, é ótima para mobilidade urbana, ajuda a fazer atividade física e a deixar seu condutor em contato com o ar livre e a natureza. 


Adorei este aqui. Ele põe em perspectiva o que é realmente o sucesso. Se ter carro, perder horas do dia no trânsito e viver estressado é “ser uma pessoa de sucesso” perante à sociedade capitalista e consumista, prefiro “parecer mal-sucedida” andando a pé, de bike ou ônibus e vivendo bem. Sucesso não está relacionado apenas a trabalho. Pode-se ter sucesso sendo mãe, pai, dono de casa, voluntário, enfim, qualquer coisa com a qual você sonha ou gosta de fazer e que vai te trazer plena satisfação. 


Triste este aqui. A primeira coisa que empresários do setor pensam é em derrubar a floresta para ganhar dinheiro. Sendo que dinheiro não é o mais importante na vida, não deve ser um objetivo e fica na Terra quando seu dono sai dela. É muito melhor para o planeta e seus habitantes manter a floresta viva, em pé. Como os empresários querem dinheiro, melhor que pensem assim: uma floresta morta dá dinheiro uma vez, enquanto que uma viva dá dinheiro sempre. Um grande exemplo disso é o ecoturismo.

Evite os 4Ds do aquecimento global. Negação (denial) – aquecimento global não está acontecendo ou, se está, humanos não o estão causando. Desilusão (delusion) – Vamos resolver o aquecimento global com uma tecnologia que conserte, como carros verdes ou carvão limpo. Derrotismo (defeatism) – Sem apoio internacional, é muito tarde para reduzir o aquecimento global. Então vamos explorar petróleo no ártico. Morte (death).

Neste cartoon, Singer alerta para os problemas de não resolver ou não tentar resolver o aquecimento global, seja negando-se a acreditar que ele exista ou ficar esperando de braços cruzados que alguém ajude. Esta é uma luta de todos os seres humanos e todos podemos, e devemos, fazer nossa parte para preservar o ambiente como o conhecemos hoje. 


Este trabalha a questão do individualismo. A pessoa dentro do carro, no conforto e ar limpo, joga gases do efeito estufa na atmosfera, que são inalados pelos pedestres. Mas na verdade, o motorista também inala, porque ele não fica em ambientes fechados 24 horas por dia. 


Quando os humanos finalmente se derem conta de que os animais não vieram ao planeta para servirem à espécie humana e que eles merecem ser tratados com respeito tanto quanto qualquer pessoa, a natureza finalmente estará em equilíbrio (ou perto dele). 


Uma gracinha este O ideal de mobilidade urbana: muitas bicicletas e poucos carros, a densidade certa. 

O que este homem precisa é de menos governo, para que ele possa estar livre de regulamentações – livre para prosperar.

Crítica política legal. Difícil prosperar quando o governo parece estar contra a população, com políticas públicas que atrapalham em vez de ajudar. 


Mobilidade urbana dos EUA na mira. Tem uma versão deste cartoon em cores que diz embaixo no quadro de baixo Tour de Brasil. Também vale. Convenhamos que está mais pra imobilidade urbana. 


Engraçado este. Já pensou se viesse mesmo com advertência? Não seria uma má ideia. Mas, como já falei aqui no blog, não se trata de demonizar o carro, mas sim usá-lo sabiamente ou às vezes substitui-lo. 

E você, o que achou dos cartoons? Adoro ler a opinião de vocês nos comentários!
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Espiritismo e Ecologia, de André Trigueiro [Resenha]

Por Letícia Maria Klein Lobe •
21 novembro 2013

A ecologia e o espiritismo são duas ciências que nasceram na mesma época, entre 1850 e 1870. As duas estão ganhando cada vez mais visibilidade e despertando mais interesse e curiosidade. Outra semelhança é que ambas defendem o uso sustentável dos bens naturais, o consumo consciente, a coletividade em detrimento do individualismo e utilizam a visão sistêmica da biodiversidade, pela qual tudo e todos são interligados e interdependentes (o termo vem da Teoria Geral dos Sistemas, do biólogo Ludwig Von Bertalanffy). O espiritismo e a ecologia oferecem ferramentas que nos ajudam a compreender o mundo a nossa volta. No livro, o leitor percebe as diversas crises que a humanidade vem enfrentando e a necessidade de desenvolvermos novas noções de realidade, novos hábitos, e termos mais comprometimento com a vida, em toda e qualquer forma.


O principal objetivo deste livro [...] é demonstrar que Espiritismo e Ecologia são ciências afins, sinérgicas, e que sugerem abordagens sistêmicas da realidade, as quais ainda não foram devidamente compreendidas ou aceitas. É justamente essa visão sistêmica da realidade que nos oferece amplas condições de navegabilidade num mar revolto em que o analfabetismo ambiental vem causando grandes estragos. É muito feliz o pensamento – de autor desconhecido – que inverte uma antiga máxima do movimento ambientalista: “Mais importante do que cuidar do planeta para nossos filhos e netos, é cuidar melhor dos nossos filhos e netos para o planeta.”

Escrito pelo jornalista ambiental e espírita André Trigueiro (autor de Mundo Sustentável), o livro apresenta capítulos curtos e objetivos que vão mostrando as semelhanças entre as duas ciências e despertando o leitor para a necessidade de preservar o planeta. O autor fala sobre brevemente sobre o espiritismo, que não se considera uma religião (na verdade, nós espíritas falamos em doutrina) e sobre sua origem, assim como conta sobre o nascimento da ecologia e o que ela estuda. O livro também passa por temas como sustentabilidade, lei da destruição (a destruição é necessária para a manutenção do equilíbrio), poluição e psicosfera, consumo consciente, publicidade e as crianças, ecologia na obra de Chico Xavier e traz ainda um pequeno dicionário ambiental com 140 verbetes.

Eu sou suspeita para falar, pois sou espírita e apaixonada pela temática ambiental (como o próprio blog mostra), mas o livro é excelente. André escreve de maneira clara e objetiva, e ainda assim cativante, apontando as semelhanças entre as duas ciências e a interdependência entre os seres vivos e o planeta com fatos, argumentos e citações. O livro proporciona uma leitura muito agradável e fluida, podendo ser lido em poucas horas. 

É muito mais um convite à reflexão e à mudança, mais sobre a realidade atual enfrentada pela humanidade e a urgência em cuidar de nós, dos outros e da Terra do que de fato uma exposição sobre espiritismo ou ecologia. Na verdade, as duas ciências são utilizadas como base e alicerce para mostrar que há muito mais entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia, como diria Shakespeare. Somos muito mais ligados à Terra do que supomos e toda ação vem acompanhada de uma reação, tanto para quem faz quanto para quem está ao redor (ou ainda nem nasceu).

Há várias citações durante o livro que eu adorei. Deixo algumas abaixo só para dar o gostinho.

Nenhuma atividade no bem é insignificante. As mais altas árvores são oriundas de minúsculas sementes. (Chico Xavier).
A Terra produziria sempre o necessário, se com o necessário soubesse o homem contentar-se. Se o que ela produz não lhe basta a todas as necessidades, é que ele emprega no supérfluo o que poderia ser aplicado no necessário. (Resposta à pergunta 705 do Livro dos Espíritos, sobre consumo).
[...] como ficar indiferente diante das perspectivas de um desequilíbrio ecológico, que torna inabitáveis e hostis ao homem várias áreas do planeta? [...] É urgente uma educação sobre a responsabilidade ecológica. (Papa João Paulo II).
[...] há chance de salvamento. Mas para isso devemos percorrer um longo caminho de conversão de nossos hábitos cotidianos e políticos, privados e públicos, culturais e espirituais. A degradação crescente de nossa casa comum, a Terra, denuncia nossa crise de adolescência. Importa que entremos na idade madura e mostremos sinais de sabedoria. Sem isso, não garantiremos um futuro promissor. (pensador católico Leonardo Boff, no livro Saber Cuidar). 

Gostou da resenha? Se ficou interessado, a leitura é super recomendada. Se quiser saber mais, André Trigueiro também tem palestras sobre o assunto.
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Um ano sem compras - Entrevista com Marina Viana

Por Letícia Maria Klein Lobe •
14 novembro 2013

Foi o que fez Marina Viana entre os meses de maio de 2011 e 2012. A psicóloga que vive no Paraná decidiu encarar o desafio de ficar 365 dias sem comprar qualquer coisa que não fosse estritamente necessária. Coisas que achamos mega importantes, mas que, na verdade, continuamos muito bem sem. Durante esse tempo, ela relatou tudo no blog Um ano sem compras, que fez para compartilhar a experiência (e no qual ela escreve até hoje). Roupas, maquiagem, produtos de beleza, calçados, bolsas, acessórios, CDs e DVDs, utensílios para casa, livros (que foram bem difíceis pra ela, que assim como eu adora ler!), revistas, entre outros, estavam na lista dos proibidos. Alguns eram liberados, claro, como xampu, sabonete, produtos de limpeza, comida, remédios, material para artesanato (que ela adora fazer), cinema, teatro e viagens, por exemplo. O objetivo? Refletir sobre o consumismo e os excessos que nos rodeiam em nossa rotina diária. Mas o projeto levou Marina muito mais além. Confira abaixo a entrevista super show que ela concedeu ao Sustenta Ações.

 Veja aqui o que Marina não podia comprar e o que ela podia comprar ou repor

Como surgiu a ideia de ficar um ano sem comprar o que achamos que é necessário? 
Marina Viana - Eu estava passando por uma fase de querer me desfazer dos excessos e fazia muitas pesquisas na internet sobre o assunto. Em uma dessas pesquisas descobri o site de uma inglesa que tinha passado um ano sem comprar na tentativa de vencer sua compulsão por compras. Achei a ideia interessante e quis fazer uma experiência semelhante, só que por outros motivos (nunca tive uma compulsão por compras). Eu queria refletir sobre o consumismo, o excesso de objetos que tinha em casa, a quantia de dinheiro que investia nisso e a minha forma de lidar com o consumo de um modo geral.

A sustentabilidade foi a ou uma das principais motivações? 
MV - Eu não diria que a sustentabilidade estava entre as principais motivações no início. Quando comecei o ano sem compras eu não sabia muito bem por que territórios eu iria caminhar e a sustentabilidade me parecia mais um efeito colateral de não comprar do que qualquer outra coisa. O interessante é que a sustentabilidade foi se tornando um tema de maior interesse da minha parte conforme o ano sem compras se desenrolava e aos poucos passou a ser um dos principais motivos para fazer algumas escolhas. Hoje eu percebo que a noção de sustentabilidade está intimamente ligada ao sentimento de pertencer a uma comunidade e ser um agente de melhoramento do mundo. Eu passei a acreditar mais na força das boas ideias e em fazer as coisas da melhor forma possível. A verdade é que meus motivos iniciais para ficar sem comprar eram bem confusos... Precisei ficar um tempo sem comprar para elaborar melhor a motivação. E aí a sustentabilidade acabou aparecendo com bastante força.

Como foi a experiência? Foi difícil no começo? Houve tentações no caminho?
MV - A experiência foi bastante intensa e diversa. Em alguns momentos foi fácil, em outros sentia mais dificuldade e assim eu fui seguindo... No início eu precisei pensar muito sempre que ia a locais voltados ao consumo, porque comprar era algo que eu fazia automaticamente. Houve momentos em que eu quis comprar sim, seria mentira dizer que não. Foi difícil deixar de comprar um livro que eu vinha procurando há anos e encontrei em um sebo, bem baratinho. Esse foi o momento mais difícil, porque a última vez que o livro foi publicado tem mais de um século...

Que técnicas você utilizou? No seu blog você fala em consumo colaborativo.
MV - Eu troquei alguns objetos com pessoas próximas e até com leitores do blog que acabei conhecendo pessoalmente. Aprendi a usar sites como o Livra Livro e semelhantes, que permitem fazer trocas com pessoas de todo o país. Outra coisa que eu fiz bastante foi dar novos usos aos produtos e objetos. Aprendi que hidratante corporal pode ser usado como creme para raspar as pernas e que uma camisa básica de botões fica ótima como uma blusinha de frio leve sobre um vestido se eu deixar os botões abertos. Tive de ser criativa, sabe? Hoje eu vejo valor e utilidade em praticamente tudo.

Como você administrou o tempo que antes era usado para fazer compras?
MV - No início eu fiquei sem saber o que fazer com esse tempo. Eu não era super consumista, mas acabei sentindo diferença em alguns momentos do dia. Na hora do almoço eu não podia comprar nada, então comecei a ler. Eu li 30 livros só nesses intervalos. Também passei a curtir mais as coisas que eu já tinha e a companhia das pessoas. Passei a desfrutar mais a vida.

O que essa experiência mudou na sua vida? Mudou sua visão de mundo? Você adquiriu novos hábitos? Quais?
MV - Mudou muita coisa! A minha visão de mundo se ampliou e percebi que muitas das inseguranças que as pessoas têm foram cuidadosamente arquitetadas e estimuladas pelo mercado. Passei a ter uma visão mais crítica desta ideia tão difundida da classe média de que a gente tem que estudar, fazer faculdade, ter um emprego que pague bastante, casar, comprar casa grande, carro bacana e ter casa na praia. E passei a ligar menos, muito menos para o que as pessoas pensam da minha vida e das minhas escolhas. Hoje em dia eu compro bem menos e me sinto realmente próspera. Aprendi a adiar o momento de comprar algumas coisas de que preciso (estou adiando trocar a geladeira há mais de dois anos e a que eu tenho, apesar de meio tosca, continua funcionando e dando conta do recado). Descobri que não preciso de quase todas as coisas que eu achava que precisava e aprendi a reavaliar as minhas necessidades para ter uma visão mais realista sobre o que é essencial, sobre o que é importante. Passei a valorizar mais os amigos, a família, meus bichos, meu trabalho e descobri que eu fico mais feliz quando levo essa mensagem a outras pessoas e trabalho para um mundo melhor, mais simples.

Quais foram os efeitos na questão econômica? A redução nos gatos foi significativa?
MV - Os efeitos foram quase nulos durante o ano sem compras. Eu não consegui juntar dinheiro, não fiz uma poupança. Acho que acabei gastando mais com coisas que eu queria fazer mas nunca sobrava dinheiro para fazer, como viajar, ir a espetáculos, etc. Hoje em dia, no entanto, estou conseguindo juntar dinheiro e me esforço para pagar quase tudo à vista. Vejo algumas pessoas próximas comprando roupas, sapatos e cremes aos montes e eu sigo vivendo em paz com as coisas que eu tenho, só comprando o que me faz falta de verdade. E como é pouca coisa, aos pouquinhos o dinheiro começa a ser empregado em coisas mais úteis.

Como foi a recepção das pessoas aos seus posts no blog Um Ano sem Compras? Você soube de leitores que seguiram seu exemplo?
MV - A recepção foi muito boa e eu não esperava isso. Algumas centenas de pessoas já passaram períodos sem compras após ler o meu e outros blogs que falam sobre consumo consciente. Eu achei que o blog fosse ter só uns três ou quatro leitores, mas ele tem milhares, o que só me leva a crer que esse movimento de repensar o consumo é algo que está realmente ganhando mais adeptos.

Quanto tempo depois de lançado o blog começou a ter boa visibilidade? Como você fazia a divulgação dele?
MV - O segredo de conseguir leitores para o blog foi participar de outros blogs com assuntos afins e comentar, manter contato. Linkar blogs que você gosta de ler também ajuda, porque o dono do outro blog começa a ver que está recebendo tráfego vindo do seu blog e vai te visitar. Se a pessoa gosta do que lê ou quer te dar mais visibilidade ela pode te linkar também. Blogar não deixa de ser uma forma de se relacionar com outros blogueiros, sabe? Aos poucos você consegue alguns leitores fiéis e começa a ter links seus por aí e a coisa começa a andar meio sozinha. O meu blog começou a ter mais visibilidade quando o ano sem compras já estava passando da metade. Foi uma coisa inesperada, sabe? Eu sempre achei que fosse ter poucos leitores.

Faz um ano e meio que você completou a tarefa. Como é a sua vida hoje? Você considera que o projeto foi um divisor de águas na sua vida? Você se considera mais feliz hoje do que antes do projeto? 
MV - Minha vida mudou bastante. Hoje aderi ao movimento que muitos chamam de vida simples e também adoto alguns princípios do minimalismo. A minha vida é dedicada muito mais às coisas que realmente importam, como minha família, meu trabalho, etc. O projeto foi um divisor de águas sim, apesar de eu continuar tendo as minhas contradições. Eu sou muito mais feliz que antes, mas isso não é só porque parei de comprar por um ano. O que mudou a minha vida foi a reformulação de muitos conceitos que eu tinha e a decisão por buscar sentido em coisas diferentes do que eu buscava antes.

Muito bacana, não é mesmo! Eu sempre pensei 10 vezes antes de comprar qualquer coisa. No começo, lá atrás, o motivo era financeiro. Há algum tempo minha maior motivação é a sustentabilidade. Desde janeiro eu comprei apenas uma peça de roupa, e ainda porque eu me esqueci de levar roupa de banho para um lugar que tinha piscina. E você, encararia o desafio? Como é a sua relação com o consumo?

ATUALIZADO: o blog Um Ano Sem Compras está aberto exclusivamente a leitores convidados. 
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Bicicletando por aí

Por Letícia Maria Klein Lobe •
07 novembro 2013
As bicicletas são cada vez mais frequentes nas cidades. Se pegarmos algumas cidades da Europa como base, a frequência é bem alta. E a quantidade também. Em 2013, a venda de bicicletas na maioria nos países da União Européia ultrapassou a de carros. É uma solução para muitos problemas e uma grande aliada da sustentabilidade. Ocupa pouco espaço, tem um preço acessível, é uma ferramenta para exercício físico, não te estressa no trânsito, permite maior opção de ruas no trajeto do que o carro e tem baixo impacto ambiental, pois não emite gases de efeito estufa e não precisa de combustível. Tanto que é um símbolo da sustentabilidade. Com quase 200 anos de história, finalmente a bicicleta está ganhando o espaço que merece. E eu ainda vou aprender a andar em uma. Sim, você leu direito, eu (ainda, veja bem!) não sei andar de bicicleta. 



A bicicleta tem muita história, mas serei breve. No fim do século XV, Leonardo da Vinci desenhou o que seria o primeiro projeto de uma bicicleta, mas os desenhos só foram descobertos em 1966, por monges italianos. A história começa de fato, porém, em 1790 com a invenção do brinquedo celerífero, criado pelo conde francês de Sivrac. Era uma construção em madeira com duas rodas alinhadas, e só. Em 1817, o engenheiro alemão e barão Karl von Drais, considerado o inventor da bicicleta, aperfeiçoou o celerífero, adicionando direção, freio e selim. Ficou conhecida como draisianaPorém, ainda faltavam os pedais, que é o sistema de propulsão da bicicleta. Quem complementou o invento foi o ferreiro escocês Kirkpatrick Macmillan, em 1839. Com mais adaptações nos anos seguintes, como por exemplo, a colocação dos pedais na roda da frente, a bicicleta tomou a forma que conhecemos hoje. 

Draisiana, criada por Karl von Drais. Fonte: D Bike

Desde as draisianas, as bicicletas se tornaram muito populares, principalmente na Europa, que foi o berço da invenção. Mesmo depois do surgimento do automóvel, em 1886, pelo alemão Carl Benz, as bicicletas eram as mais pedidas, principalmente devido às duas grandes guerras. Sem dinheiro e precisando se reerguer do zero, os países europeus evitam ao máximo gastos desnecessários. A bicicleta virou até política de desenvolvimento econômico e social, como conta o site Escola de Bicicleta. Após a segunda guerra mundial, a Europa conseguiu se reerguer com a ajuda dos Estados Unidos, o que acabou fortalecendo a indústria automobilística empreendida por Henri Ford. 


Bicicleta com pedais, criada por Kirkpatrick Macmillan. Fonte: D Bike

Enquanto em alguns países a bicicleta foi sendo aos poucos substituída por carros e motos, em outros, como a Holanda, o uso dela foi intensificado, pois se viu que a bike era uma forma de uso inteligente do espaço urbano. Até hoje, países europeus são alguns dos que mais utilizam bicicletas. Em 2013, como informa o site Mobilize, a venda de bikes por lá superou a de carros. Apenas em dois países dos 27 que compõem a União Européia (Bélgica e Luxemburgo), isso ainda não é realidade. 

Na Alemanha foram 3.966 milhões de bicicletas para 3.083 milhões de automóveis; no Reino Unido foram 3.600 milhões para 2.045 milhões; na França, 2.835 milhões para 1.899 milhões, na Itália, 1.606 milhões para 1.402 milhões e na Espanha, que não tinha tradição em bicicletas, as vendas foram de 708 mil para 700 mil. Um dos fatores que fez com que houvesse esse boom de bikes na Europa foi a crise econômica dos últimos anos. O número de carros vendidos ainda é muito alto, mas ver que as bicicletas se tornaram um concorrente à altura é excelente, especialmente em tempos em que ser sustentável deixou de ser opção para se tornar necessidade e estilo de vida. 

Mas não é só lá que as bikes fazem sucesso. No oriente elas também são muito populares. Pouco depois da invenção da draisiana, segundo Escola de Bicicleta, elas foram parar no Japão, que logo entrou no mercado internacional de fabricação do veículo. Na China, as bicicletas começaram a se popularizar a partir de 1949, com a Revolução Comunista. Na Índia e em Taiwan elas também fazem parte da paisagem. Na China, de acordo com Mobilize, a venda de bikes em 2013 também superou a de carros: foram 28 milhões contra 19,3 milhões. Só que nesse caso as bicicletas são elétricas. São melhores que carros, mas eu ainda prefiro as normais, pensando pelo lado sustentável.


Chinês em sua bike elétrica

Enquanto isso, no Brasil... A realidade é outra. O Mobilize informa que as indústrias do Polo Industrial de Manaus contabilizaram 875.835 bicicletas vendidas em 2012, quase 6% a mais do que no ano anterior. Carros vendidos? Até o início de outubro deste ano, foram 2.780.330, de acordo a Federação Nacional dos Distribuidores de Veículos Automotores (Fenabrave). É uma grande diferença. Se levarmos em conta o tamanho do Brasil então, ela fica maior ainda. O incentivo ao uso de bicicletas ainda é pequeno e a cultura do carro é forte. Mas eu acredito, acho que é tendência até, que isso mude. Novos tempos pedem novos hábitos e o uso da bicicleta e de formas ambientalmente conscientes de se locomover é um deles. 

Em várias cidades existem sistemas de compartilhamento de bicicletas. Dependo da duração do trajeto, o uso pode sair de graça. Aqui em Blumenau foi implantado, mas infelizmente não deu certo. Rio de Janeiro e São Paulo têm (BikeRio e BikeSampa). Existe também em Londres (Barclays Cycle Hire), Paris (Velib) e Nova Iorque (Citi Bike), para citar alguns exemplos. Berlim é um baita modelo de cidade onde as pessoas compartilham bicicletas. São 400 serviços de compartilhamento gratuito! Conheça como funciona um deles, o Bike Surf, nesta reportagem da coluna Sustentável, do Jornal da Globo. Que show!


Mapa das ciclorrotas em São Paulo. Baixe aqui

Para que as cidades se tornem cada vez mais sustentáveis e as pessoas passem a ter estilos de vida mais saudáveis e ambientalmente amigáveis é preciso que os governos adotem políticas de mobilidade urbana que priorizem o uso de bicicletas e transportes públicos de massa, como metrô, trem e ônibus. No caso das bicicletas, é necessário também que a cidade implante ciclovias, para que seja seguro andar por aí sobre duas rodas. Na Europa, é possível ir de um país ao outro seguramente de bicicleta, seguindo, por exemplo, pela ciclovia do Rio Danúbio, que atravessa Alemanha, Áustria, Eslováquia, Hungria, Croácia, Sérvia, Bulgária, Ucrânia e Romênia. É uma rota muito utilizada por cicloturistas. Quem sabe um dia eu faça esse passeio, pelo menos um trecho... Vontade não falta!


Ciclovia da Rio Danúbio

Se na sua cidade não tem ciclovia (aqui em Blumenau tem um pseudociclovia, que só passa no centro), tomar medidas de segurança nunca é demais, como andar na direção contrária à dos carros, para que você possa olhar de frente para eles e assim evitar acidentes. Além, é claro, dos itens obrigatórios pela lei brasileira, como campainha, sinalização noturna dianteira, traseira, lateral e nos pedais e espelho retrovisor do lado esquerdo – que, aliás, é uma questão controversa, pois é mais importante para o ciclista se concentrar no que está a sua frente do que atrás (leia mais sobre isso aqui). 

Você costuma andar de bicicleta? Vai para o trabalho, escola ou centro de lazer sobre duas rodas? Ou é apenas um hobby? Ah, me conte também se ficou com vontade de viajar por aí de bike. Até mais! 
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