Pois é. A gente costuma associar
produtos cosméticos, cheios de componentes, à
limpeza; quando faz espuma, então, aí sim que limpa. Mas ao que tudo indica, quanto
mais natural for o processo de higienização do seu corpo (e da sua casa também), mais saudável e protegido ele será. Isso acontece porque muitos produtos convencionais do mercado possuem
sulfatos,
parabenos e
petrolatos, que são prejudiciais à saúde, ao ambiente e desequilibram a flora natural da pele, que tem suas bactérias próprias responsáveis pela proteção e controle de oleosidade e odor.
James Hamblin, editor da revista Atlantic, encarou o desafio de parar de tomar banho.
Neste artigo, ele explica que o odor dos corpos é produto de
bactérias que vivem na pele e se alimentam de secreções oleosas do suor e de glândulas sebáceas que ficam na base dos folículos de pelos. Usar
sabão e
shampoo todos os dias perturba o
equilíbrio que existe entre os óleos da pele e as bactérias que moram nela. O uso intenso destes produtos no banho acaba com este ecossistema. E aqui está o ponto: as bactérias se reproduzem de novo e repovoam a pele, porém, elas acabam ficando em desequilíbrio e tendem a favorecer os micróbios que produzem cheiro. Em outras palavras, quanto mais produtos você passar, mais vai precisar passar para combater o estrago que eles mesmos criam. É o tal do ciclo vicioso.
Em termos técnicos,
retroalimentação (o feedback). O sistema vai se retroalimentando para melhor ou pior. Neste caso, para pior. Aconteceu comigo quando eu tive dermatite atópica: quanto mais eu coçava, mais a lesão em si produzia coceira, o que me fazia coçar mais. Pegou o fio da meada? A mesma lógica se aplica ao
desodorante. Conforme você vai diminuindo a quantidade de desodorante e a frequência de aplicação, menos precisa. Aqui há uma ressalva, porém: a alimentação interfere bastante no odor do corpo. Depois que adotei uma dieta vegetariana (com acompanhamento da nutricionista), percebi que meu odor natural ficou mais suave. Fiz o teste do desodorante e comprovei que funciona!
Hoje, James diz que não usa shampoo nem sabonete e quase nunca toma banho. Além de economizar dinheiro e água, ele diz que vai poupar até o fim da vida 12.167 horas, quase dois anos! Mas peraí, e o
cheiro? Ele e outras pessoas adeptas do desafio
no-showering (sem banho) dizem que no começo ficaram parecendo "monstros oleosos e fedidos". Mas depois de um tempo, os ecossistemas do corpo acham seu ponto de equilíbrio de novo, agora sem a interferência de produtos cosméticos, e a pessoa não cheira mais mal. O odor é o natural de uma pessoa, diz James. Sem a interferência de produtos químicos, a pele não fica flutuando entre seca e oleosa, mas permanece no seu ponto ideal.
Eu já testei um pouco isso e posso dizer que funciona. Oh!
Calma, não parei de tomar banho! Mas quando tive o probleminha na pele, a dermatologista recomendou não usar sabonete no banho durante o tratamento (no mínimo 20 dias), até para não interferir nos produtos prescritos. Garanto que não fiquei nada fedida. Na verdade, foi o inverso. Só a água já lava mesmo, pode fazer o teste. Mas precisa esfregar, tá? Duas editoras do site Total Beauty ficaram 30 dias sem tomar banho e
contaram a experiência, que teve resultados fantásticos para a pele, bem melhor do que quando usavam dezenas de produtos.
Primeiro vídeo de três do The Atlantic sobre a microbiota da pele
Produtos naturais
Além do no-showering, existem também as técnicas low-poo (pouco shampoo) e no-poo (nenhum shampoo). Quem criou foi Lorraine Massey, fundadora da marca Deva Curl, especializada em produtos de beleza para quem tem cabelos cacheados (os termos foram registrados por ela e agora são marcas - No-Poo® e Low-Poo®. Assim, devem haver mudanças em breve em relação à nomenclatura, que também era usada por outras empresas).
Quem aplica a técnica do low-poo utiliza menos shampoo e substitui o shampoo comum por um sem sulfatos pesados, porque estas substâncias causam ressecamento e perda da oleosidade natural do couro cabeludo. Os produtos também devem ser sem petrolatos, componentes provenientes do petróleo que blindam os fios do cabelo a outras substâncias que são importantes.
Estes são os sulfatos que não podem estar na lista de ingredientes dos adeptos do low-poo:
Sodium laureth sulfate
Sodium myreth sulfate
Sodium lauryl sulfate
Ammonium lauryl sulfate
Ammonium laureth sulfate
Sodium c14-16 olefin sulfonate
Tea lauryl sulfate
Tea-dodecylbenzenesulfonate
Sodium alkylbenzene sulfonate
Ammonium or sodium xylenesulfonate
Sodium cocyl isethionate
Sodium lauryl sulfoacetate
Sodium socoyl (or lauryl/lauroyl) sarcosinate
Ethyl peg-15 cocamine sulfate
Dioctyl sodium sulfosuccinate
Sodium lauryl glucose carboxylate
Methyl cocoyl or lauryl taurate
Sodium cocoyl glycinate
E estes os petrolatos:
Petrolatum/petrolato
Mineral oil/óleo mineral
Parafinum liquid/parafina líquida
Vaselina/vaselin
Isoparafina/isoparafin
Isododecano/isododeceno
Alcano/alkane
Hidrogenated polysobutene
Além destes, tem os parabenos. Não são proibidos pela técnica do low-poo, mas faz bem deixar de usar produtos que contenham estes compostos químicos. Eles são conservantes, encontrados normalmente sob os nomes metilparabeno, propilparabeno, etilparabeno e butilparabeno. Ainda não se comprovou se eles de fato causam câncer (pesquisam estão sendo desenvolvidas), mas já se sabe que provocam alergias cutâneas, envelhecimento da pele e interferências no sistema endócrino de humanos e outros animais.
A técnica do no-poo não permite o uso de shampoo nem de produtos que tenham silicones insolúveis em água (os solúveis valem). Tem gente que aplica o co-wash (lavagem com condicionador) ou somente receitas caseiras. Então, além dos listados acima, também se deve evitar os silicones insolúveis, que são:
Dimethicone
Amodimethicone
Cetearyl methicone
Cetyl dimethicone
Cyclomethicone
Cyclopentasiloxane
Dimethiconol
Stearyl dimethicone
Trimethylsilylamodimethicone
Simethicone
Polydimethylsiloxane
Methicone
Phenil trimethicone
Dimethylpolysiloxane
Bis-aminopropyl dimethicone
Vale tirar fotos dos componentes para verificar a lista de ingredientes dos produtos.
Neste link,
aqui e
acolá estão explicadas as rotinas destas práticas, como fazer, produtos liberados e outras informações.
Menos é mais
A canadense
Katherine Martinko e a brasileira
Letícia González, editora da Marie Claire, ficaram meses sem usar shampoo nem condicionador nem creme para cabelo e ficaram com suas madeixas mais bonitas e fortes.
No-poo mesmo! A receita é simples:
bicarbonato de sódio e
vinagre de maçã. De uma a duas colheres de sopa de cada ingrediente em copos de água separados. Primeiro você coloca a solução de bicarbonato aos poucos no couro cabeludo e massageia. Depois finaliza com o vinagre e enxágua bem. Lucy AitkenRead, do
blog Lulastic, recomenda não mais do que uma colher de sopa de bicarbonato uma vez por semana depois que seu cabelo restaurar o equilíbrio natural. É bom aplicar uma receitinha caseira para hidratar os fios uma vez por mês. Há várias por aí na internet, com banana e abacate, por exemplo.
O cabelo de Katherine Martinko com bicarbonato de sódio e vinagre de maçã
A
redução de banhos e de
produtos de higiene e limpeza economiza dinheiro e água, pois um banho tem uma média de sete minutos e um uso de 65 litros de H2O, como lembra
Madeleine Somerville, jornalista do The Guardian. Sem falar nos
resíduos sólidos gerado pelas
embalagens dos produtos! O bom do bicarbonato de sódio é que ele pode ser comprado a granel e o vinagre de maçã vem no vidro.
Neste artigo muito bom da revista Trip, a jornalista Nina Lemos fala de
“uma espécie de ‘doença social’ que faz com que passemos a achar que coisas naturais, como secreções, suor, menstruação e pelos são uns trecos nojentos”. É um apelo a não termos nojo de nós mesmos e nos permitir sermos humanos, com tudo que isso implica. Não precisa deixar de tomar banho, mas entender que, se você ficar o dia inteiro em casa fazendo nada, é perfeitamente normal não achar um banho necessário e ir para a ducha só no dia seguinte. Ou quando você quiser.
O que a gente precisa mesmo é se libertar das garras da sociedade de consumo, das imposições disfarçadas de sedução da indústria e se empoderar. Pesquisar, refletir, questionar e se fortalecer contra a opressão do sistema no qual vivemos, mas ao qual não precisamos pertencer. É o apelo de que cada vez mais pessoas por um mundo livre, saudável, justo e ambientalmente equilibrado. É o que eu quero, e você?
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