Impactos e perspectivas ambientais da greve dos caminhoneiros

Por Letícia Maria Klein •
28 maio 2018
Mais de 64 milhões de aves sacrificadas, morte de pelo menos 1 bilhão de aves e 20 milhões de suínos nos próximos cinco dias por falta de alimentação adequada, prejuízo de bilhões de reais nos mais diversos setores da economia, descarte de mais de 300 milhões de litros de leite, diminuição da frota do transporte coletivo, falta de combustíveis nos postos, escolas e universidades fechadas, aumento do preço de diversos alimentos frescos, voos cancelados, hospitais defasados de medicamentos, comida e dos seus próprios profissionais, que têm dificuldade de acesso. Tudo isso e ainda mais que pode vir a acontecer é resultado da greve dos caminhoneiros, que começou no dia 21 de maio.

Protestos na BR-470, em SC
Foto: PMSC/Divulgação
Os impactos socioambientais são grandes e muitos. Um deles é a morte de uma quantidade tão grande de animais. Muitos estão sendo enterrados porque não tem caminhão para retirá-los, mas a decomposição de tantos seres no mesmo espaço pode poluir o lençol freático, e por consequência rios e lagos, sendo potencialmente prejudicial à saúde pública. Por falar em saúde, os hospitais também estão sofrendo com a falta de recolhimento de resíduos sólidos. Se continuar, a coleta de resíduos nas cidades também ficará prejudicada e as montanhas de lixo se transformarão em focos de vetores transmissores de doenças.

O comércio e a indústria estão sendo diretamente afetados, eventos estão sendo cancelados ou tem pouco público, pessoas estão correndo o risco de ficarem sem tratamento nos hospitais, toneladas de alimento e outros recursos estão sendo desperdiçados, causando um grande problema socioambiental em termos de geração de lixo, perda de matéria-prima, poluição e gastos de dinheiro. Até o abastecimento de água fica comprometido, pois podem faltar os produtos químicos necessários ao processo de limpeza nas estações de tratamento de água.

Os caminhoneiros têm seus motivos para protestar e todos têm direito de se manifestar contra o que lhes prejudicam. Porém, quando essa manifestação sobrepõem o direito de outras pessoas de atender a suas necessidades ou quando fere os diretos básicos de cada cidadão, o ato continua legítimo? É ético submeter milhões de pessoas e outros seres vivos ao sofrimento, causando caos? Tem um ditado que diz que o escândalo é necessário, mas ai daquele que o provocar. Esse escândalo está muito grave, mas como tudo na vida tem seu lado positivo e negativo, a greve dos caminhoneiros tem nos mostrado que precisamos de reformas urgentes e grandes no país.

Sofremos com a alta carga tributária e seu mau uso pelo poder público em vários momentos. O problema não é só o diesel. Porém, reduzir custos de um lado e compensar do outro, como prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal através do aumento de outros tributos, não vai à raiz da questão. Sempre tem alguém que paga a conta, nada sai de graça para ninguém. Isso se chama externalização de custos. Existe uma ideia de que o governo pode arcar com as contas, pode bancar os mais variados gastos, assim nós não precisamos pagar. Só que isso é uma falácia. Quem alimenta a máquina pública, afinal, somos nós, cada um dos cidadãos do país. 

Quanto mais tempo a greve dura, mais evidente é a necessidade de repensar e reestruturar o sistema de transporte de cargas no país, privilegiando ferrovias, hidrovias e combustíveis renováveis, que não tenham origem no petróleo. É fundamental diminuir a dependência da sociedade em combustíveis fósseis, que não se renovam e cujo processo de extração deve ficar cada vez mais caro. Dar subsídios ao diesel só prolonga um problema que precisa ser solucionado logo, com tecnologias limpas e inovação em sustentabilidade. Além disso, a situação da maioria das estradas no país, pelas quais passam os caminhoneiros dia após dia, são deploráveis. Como mostrou essa reportagem, o uso de caminhões para transporte de cargas no Brasil é caro, ineficiente e perigoso.

Com a falta de combustíveis para carros de passeio, o número de bicicletas aumentou nas ruas aqui de Blumenau. A quantidade de pessoas no transporte coletivo também. O investimento em mobilidade urbana sustentável é uma das ferramentas da cidade carbono zero e traz vários benefícios, como economia de dinheiro (em comparação a ter o carro próprio), redução da emissão de poluentes, rapidez no trânsito e exercício físico (no caso da bicicleta). Cidades do futuro também serão mais eficientes em termos de geração de energia limpa e estrutura completa de saúde, educação, produção e entretenimento num raio de curtas distâncias.

Que esse cenário de crise que se vive hoje no Brasil, típico de filme futurista, seja muito mais um convite às mudanças rumo ao planeta sustentável que precisamos do que um prenúncio de uma realidade distópica.

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